Elas poderiam não ter recebido muita atenção nos EUA, onde fica a matriz do Google. Mas aqui, assim como em outros lugares da Europa, uma ideia se enraizou: os indivíduos devem ter o "direito de ser esquecidos" na web.
O governo da Espanha está defendendo essa causa. Ele ordenou que o Google pare de indexar informações sobre os 90 cidadãos que depositaram queixas na Agência de Proteção de Dados. O caso está sendo observado na Europa, pois poderá afetar o controle que os cidadãos têm sobre a informação que publicaram ou foi publicada sobre eles na rede mundial.
A União Europeia também deverá interferir ainda neste ano com novos regulamentos sobre o "direito a ser esquecido".
"Não aceito que os indivíduos não tenham influência sobre seus dados depois que são lançados no ciberespaço", disse Viviane Reding, a comissária de Justiça da UE. Ela ouviu o argumento de que era impossível um maior controle, e que os europeus deveriam "se acostumar com isso".
Franz Werro, um professor de direito na Universidade Georgetown em Washington, caracterizou a questão como "um choque transatlântico". Nos EUA, disse Werro, os tribunais decidiram que o direito de publicar a verdade sobre o passado de uma pessoa supera qualquer direito à privacidade.
"Na Europa, você não tem o direito de dizer qualquer coisa sobre uma pessoa, mesmo que seja verdade", ele disse.
A perspectiva europeia foi moldada pelo modo como a informação foi obtida e utilizada contra os indivíduos sob ditaduras como as de Franco e Hitler e sob o comunismo. Na Alemanha, Wolfgang Werlé e Manfred Lauber, que se tornaram infames por matar um ator alemão em 1990, estão processando a Wikipedia para eliminar o verbete sobre eles. As leis de privacidade alemãs permitem a supressão de identidades criminosas em reportagens da mídia quando as pessoas já saldaram sua dívida com a sociedade.
O Google também enfrentou processos em vários países por seus esforços em tirar fotografias para o Street View. Na Alemanha, onde os tribunais consideraram o Street View legal, o Google permitiu que indivíduos e empresas optassem por não participar, o que 250 mil fizeram. A questão não teve muito apoio nos EUA, onde qualquer pessoa tem o direito de tirar fotos de qualquer coisa que seja visível na rua.
O Google não quis comentar os casos da Espanha, dizendo apenas que exigir que máquinas de busca ignorem alguns dados "teria um efeito nocivo profundo para a livre expressão". A Agência de Proteção de Dados da Espanha, criada na década de 1990, acrescenta que o buscador modificou o processo pelo qual os dados são esquecidos --e, portanto, há necessidade de ajustes.
O vice-diretor da agência, Jesús Rubí, citou o diário oficial do governo, que costumava publicar todos os dias da semana leilões de falência, anistias oficiais e aprovados em exames do serviço público. Geralmente com 220 páginas de letras miúdas, ele acumulava poeira em prateleiras de depósitos. A informação estava lá, mas não era facilmente acessível.
Então, dois anos atrás, a publicação de 350 anos entrou na rede, possibilitando que informações embaraçosas fossem obtidas. Rubí disse que duvidava que alguém tivesse a intenção de que a informação assombrasse os cidadãos para sempre: "Tenho certeza de que se a lei fosse escrita hoje, os legisladores diriam: 'Está bem, publiquem isso, mas não deve ser acessível por uma máquina de buscas'".
Fernando Pérez, diretor do diário oficial do governo espanhol, em seu escritório em Madri |
O editor da publicação, Fernando Pérez, disse que a intenção foi promover a transparência. "Mas talvez haja informação que tem um ciclo de vida e só tem valor durante algum tempo", ele disse.
Especialistas dizem que o Google e outros mecanismos de busca veem alguns desses casos jurídicos como um ataque a um princípio da lei estabelecido --que os mecanismos de busca não são essencialmente responsáveis pela informação que coletam na rede mundial. As empresas acreditam que, se há problemas de privacidade, as reclamações deveriam dirigir-se àqueles que postaram o material na web.
Mas alguns especialistas europeus discordam. "Elas [empresas de busca] dizem que não estão publicando, por isso você deve reclamar em outro lugar", disse Javier de la Cueva, um advogado de Madri especializado na relação entre lei e tecnologia. "Mas são elas que estão espalhando a notícia. Sem elas, ninguém conseguiria encontrar essas coisas."
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