quarta-feira, 2 de março de 2011

Atenção parcial constante

Uma curva exponencial, em seu início, é parecida com uma horizontal. As grandezas que registra crescem tão lentamente que é fácil considerá-la estática por um bom tempo. Até que um dia, quando ninguém mais presta atenção, ela resolve se mover. Como uma tsunami no horizonte, seu crescimento é certeiro e evidente, engolindo o que estiver no caminho e se recusar a compreendê-la.
Boa parte do desconforto sentido pelas pessoas e empresas com relação às mais recentes tecnologias e interações vem da busca por ignorá-las, acreditando que são modinhas passageiras que eventualmente desaparecerão. Isso não faz o menor sentido. Se um dia as pessoas pararem de mandar vídeos para um YouTube (que hoje cresce à espantosa razão de 35 horas por minuto) é porque o trocaram por outro serviço. Como ele, Twitter, Blogs, Quora e outras redes são manifestações livres de identidade. Os números do Facebook mostram claramente que, uma vez aberta a porta da expressão, ela nunca mais se fecha. Pelo menos não voluntariamente.
O excesso de demandas sociais cria uma forma diferente de desconforto entre seus usuários. Não é mais o medo da ferramenta ou a nostalgia por um mundo analógico que incomoda, mas a incapacidade de repartir a atenção entre todos que a pedem. Como uma babá substituta de uma creche em dia de calor, o indivíduo se vê jogado em um ambiente sobre o qual não tem controle, e é obrigado a atender a todas as demandas o mais rápido possível.
A atenção parcial é constante. Já que todos os interlocutores se sentem únicos e demandam um interesse que simplesmente não há como suprir, as conversas são conduzidas até chegarem à velocidade de cruzeiro, depois deixadas em piloto automático até a aterrissagem ou o contorno de turbulências. Nesse período, outras conexões são administradas em um constante e extenso malabarismo social.
Todo esse processo é, naturalmente, extenuante. E recente. Os e-mails eram mais rápidos do que as cartas, mas ainda respeitavam o tempo da comunicação escrita. Os bilhetinhos via Twitter ainda podem ser esquecidos em um bolso ou respondidos mais tarde. Já as redes de mensagens instantâneas como o SMS, o MSN, o chat de mídias sociais e o Skype são... bem, instantâneas. Quem não responde a seus chamados age como se deixasse seu interlocutor a falar sozinho. Ou como se lhe desse as costas para falar com outro. São atitudes inaceitáveis no mundo real, e vistas com péssimos olhos no digital.
Tudo isso gera uma natural ansiedade. Ela pode se manifestar de diversas formas: no desconforto de quem é mal interpretado por cometer uma indelicadeza em uma janela de comunicação instantânea. Na sensação de inutilidade e procrastinação de quem adia as prioridades, a alimentação, o sono e a atividade física enquanto acompanha o movimento nas redes sociais. No esgotamento de quem teve um dia com muitas demandas e, para descansar, resolve levar o cérebro à exaustão em um videogame. Nas mudanças repentinas de humor ou formas de tratamento de quem acredita ser múltiplo. Na obrigação de descobrir coisas novas só para compartilhá-las com quem não terá tempo de lê-las. Na necessidade de comentar cada ação de seus amigos, mesmo que nada seja dito nesse comentário. No desespero quando o celular ou computador pessoal é usado por algum amigo ou membro da família. No voyeurismo de visitar perfis de amigos do passado com o único objetivo de se comparar com eles... a lista não tem fim.
Precisamos de novos parâmetros de etiqueta digital para administrar os tempos, as redes e os contatos antes que suas demandas se tornem incontroláveis. Muitas delas ainda parecem inofensivas, como o são todas as manifestações no começo de uma curva exponencial.

Nenhum comentário: