EM RECIFE - O Porto Digital, instalado no coração histórico de
uma das mais antigas cidades das Américas, Recife, fez desta metrópole
do Nordeste brasileiro o terceiro polo de informática e comunicação do
país, atrás de São Paulo e do Rio de Janeiro. Fruto de uma iniciativa
criada em 1996 por um grupo de professores de informática fartos de ver
seus alunos partindo para os quatro cantos do Brasil e do mundo, o
projeto agora enfrenta o desafio da aceleração digital e precisa
responder à difícil questão da geração de inovações "em nível mundial".
Os professores em questão lecionavam na Universidade Federal de
Pernambuco (Estado do qual Recife é capital), e formavam excelentes
engenheiros que se deparavam com sérias dificuldades para encontrar
empregos em sua cidade. E os dispostos a abrir companhias próprias eram
rapidamente recrutados e transferidos para outras regiões.
Cansados de perder esses profissionais, os professores criaram o Centro
de Estudos e Sistemas Avançados de Recife (CESAR), uma instituição
privada cujo objetivo era mudar a dinâmica entre a universidade e as
empresas. Convencido pelo êxito obtido, o governador de Pernambuco
decidiu em 2000 criar um polo de desenvolvimento de software, o Porto
Digital, que conta com apoio municipal, estadual e federal.
O aspecto mais surpreendente da decisão é que o polo foi estabelecido no
centro histórico da cidade, uma ilha carcomida pelo sol, o mar e o
abandono. Membro do grupo fundador de professores e hoje presidente do
conselho executivo do CESAR, Silvio Meira queria instalar o centro perto
da universidade, que a ditadura militar instalou precavidamente
distante do centro. Mas Claudio Marinho, então secretário da Ciência e
Tecnologia de Pernambuco, lutou para convertê-lo em elemento de
renovação urbana. Meira se deu por vencido depois de vários meses de
hesitação, e de não conseguir encontrar nem mesmo um restaurante decente
perto da universidade. A classe criativa também carece de certas
comodidades.
O saldo positivo é que o Porto Digital agrupa 200 empresas, com 6,5 mil
empregados. Os programadores agora ficam em Recife. Grandes empresas,
como a Accenture e a Nokia, procuram a cidade. Mas passar da criação de
empregos à inovação requer numerosos saltos qualitativos.
O Porto Digital aposta na "indústria da criação", dos videogames à arte
digital, passando pelo cinema e publicidade, sem esquecer os meios de
comunicação. O CESAR acentua a pesquisa e desenvolvimento e opera
diversos "Labs" (especialmente de sistemas embarcados e TV digital), bem
como um programa centrado no processo de inovação.
Silvio Meira tem como preocupação pessoal o aspecto do design,
principalmente o de modelos de negócios. E não é porque isso esteja na
moda, afirma. No ano passado, ele me disse que as companhias do Vale do
Silício se equivocam quando apostam seu futuro nisso, enquanto
terceirizam a produção para empresas estrangeiras. "O 'brainware' e os
cérebros brasileiros são tão bons quanto quaisquer outros", foi o que me
disse então. E esse campo é mais barato que o desenvolvimento de uma
indústria automobilística.
"Vamos tentar criar empresas de nível mundial, que algoritmos que
mantenham a rota em nível mundial", diz Meira. "Mas os do Skype, Google
ou Facebook são inacessíveis para as instituições educativas da maioria
dos países. São precisos decênios para chegar a esse nível".
Falta o "desenho", que ele vê como um processo em quatro etapas. As três
primeiras são conhecidas de todos: conhecimento (resultado da
educação); espírito empresarial e investimento. A isso ele acrescenta o
conceito de "compreensão da complexidade dos problemas de corte mundial e
capacidade de gerar respostas". É um conceito um tanto abstrato, mas
ninguém sabe dizer com certeza se esta porta poderá ou não ser aberta.
Em Recife e em outros lugares.
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