terça-feira, 5 de junho de 2012

Inovação: o desafio dos tempos

A relação com o tempo talvez seja o que mais separa o Vale do Silício daquilo que observo à minha volta no resto do mundo. Na Califórnia, todo o sistema repousa, por bons motivos econômicos, na velocidade de concepção, execução e na estratégia de saída (a aquisição ou abertura de capital da empresa). Isso está integrado até ao desenvolvimento de aplicativos, com o conceito de "versão beta", que consiste em colocar um produto no mercado antes que este esteja pronto, e melhorá-lo levando em conta as reações dos usuários.
Mas do Brasil à Índia, e em todos os demais lugares que visitei recentemente, o tom parece muito diferente. Em Recife, Sílvio Meira --professor de informática que desempenhou papel chave no desenvolvimento da cidade conhecida como terceiro polo tecnológico do Brasil (atrás apenas de São Paulo e do Rio de Janeiro), me disse que "o Vale do Silício demorou 30 anos para consolidar sua posição. A Índia está se esforçando para desenvolver Bangalore desde os anos 70. Não é algo que possa ser realizado com uma varinha de condão. É precisa capacitar dezenas de milhares de engenheiros e aprender a operar sistematicamente". E também é preciso, sempre, despertar o espírito empresarial.
Em Jacarta, Indonésia, Mamuaya Rama --fundador do site de informações DailySocial.net me acompanhou em uma visita à incubadora Merah Putih, explicando que as empresas iniciantes demoram muito a sair da incubadora --18 meses ou mais. "A maioria delas é criada por pessoas muito jovens e sem experiência de negócios, como eu. O objetivo é nos estabelecermos como empresas estáveis. E para consegui-lo não se pode estabelecer um limite de prazo".
Em Mumbai, Índia, Vishal Gundal, empreendedor tornado empresário, também estudou o processo do Vale do Silício. Não apenas "o que se faz nos Estados Unidos em dois anos aqui demora quatro ou cinco, e o longo prazo pode se estender a sete ou 10", como a dinâmica não ganha ímpeto até que uma ou duas empresas iniciantes consigam sucesso suficiente para entusiasmar os jovens e inspirá-los a realizar aventura semelhante.
É uma ideia acentuada por Poyni Baht --diretora da SINE, a incubadora do Instituto Indiano de Tecnologia em Bombaim, criada em 1999. "Faltam-nos exemplos", disse. "Não contamos com empresários de sucesso suficiente para criar uma comunidade. A experiência é limitada. E fracassar continua a ser tabu. É uma questão de ecossistema".
Mahesh Samat, ex-diretor da Disney na Índia, está convicto de que "os mercados emergentes não crescerão de um dia para o outro. Não foi o que aconteceu nos Estados Unidos e nem na Europa. Seguirão uma curva normal. O crescimento vertiginoso é uma exceção".
O dinheiro não é um verdadeiro problema. Está disponível em toda parte, mas as pessoas que o têm não estão habituadas a riscos e desconfiam da intangível economia do conhecimento. Preferem "dar dinheiro a um filho idiota que a um desconhecido que o mereça", disse o empresário e investidor Mahesh Murthy, ele mesmo integrante de uma estirpe de brâmanes. Tudo isso vai mudar, mas será preciso esperar o amadurecimento de jovens criados na cultura digital e filhos de famílias ricas.
Há duas lições a extrair quanto à importância do tempo para o desenvolvimento da inovação em todo o mundo. A primeira é que a vontade de agir com rapidez pode ser uma armadilha, tanto para os investidores locais ansiosos por imitar o Vale do Silício quanto para os estrangeiros impacientes por aplicar um modelo que funciona em seus países a outros mercados.
A segunda é que o mundo pode ser plano mas não é liso. Policrônico, opera em diferentes velocidades a um só tempo. A inovação requer dinheiro, organização, desenvolvimentos líquidos, mas seu avanço está entremeado de comportamentos herdados da tradição... e que se movem em câmera lenta.
Mas não nos equivoquemos. A verdadeira constante, por trás desses tempos múltiplos, é que a inovação fervilha em toda parte.

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