Prossigo em tratamento, tentando me curar do vício e da intoxicação
digital. Ser minha própria médica barateia o processo. No bom e no mau
sentido.
Li o livro de autoajuda de Daniel Sieberg chamado "The Digital Diet".
Comprei on-line. Consegui me apropriar de alguns conselhos e minha
produtividade aumentou. Mas não todo dia, porque tenho recaídas.
Não toco no telefone quando estou dirigindo. Proibi a entrada de
aparelhos com acesso à internet no quarto de dormir. Agora procuro não
admitir o telefone sobre a mesa de refeições. Mas nem sempre consigo.
Quando estou acompanhada é mais fácil. O olhar dos outros me ajuda.
Quando estou sozinha é quase impossível. Deixo a comida esfriar e nem
sinto o sabor, entretida com algo alheio à refeição.
Nos cafés de San Francisco, como o Nook da esquina, todos parecem se
comportar como eu: todos estão sozinhos com suas máquinas, cada um em
sua mesa, deixando as relações virtuais substituírem as relações reais. O
que estaríamos fazendo, se não fosse a internet?
Imagino menos pessoas sozinhas nesses cafés, à exceção dos escritores,
claro. Acho que estaríamos espiando uns aos outros com mais atenção.
Espiaríamos pessoas de verdade, não os clones marqueteiros de si mesmos
que povoam o Facebook. Eu também tenho clones.
Nas últimas semanas, investi tempo cancelando assinaturas de boletins
por e-mail, alertas de notícias e de redes sociais. Tentei reduzir ao
essencial, mas confesso que esse essencial continua muito inchado. Julgo
pela minha angústia. Julgo também pelo meu fracasso em manter a leitura
dos e-mails em dia.
Desprezei o conselho de baixar softwares para monitorar quanto tempo
gasto com cada atividade on-line. Achei que usar mais tecnologia para
usar menos tecnologia seria um contrassenso. Mas admito que outros
possam se beneficiar com a estratégia.
A água vitaminada que tomo agora para me hidratar neste deserto traz a
seguinte mensagem. "Por que checamos e-mails e, um minuto depois,
checamos de novo? Por que a gente olha para o nosso telefone celular sem
nenhuma razão? Ele não vibrou nem tocou. Bem, enquanto você está
fazendo isso, por que não experimentar esta bebida? Ela contém cafeína
para ajudar o foco mental. Agora você pode tentar focar aquelas coisas
que você realmente quer focar, como por que foi mesmo que ela deixou de
ser minha amiga na internet?"
Também tenho me controlado para diminuir o número de softwares e janelas
abertos simultaneamente nos meus computadores. Sim, tenho vários. Mas
uma amiga escreveu perguntando onde estou, pois não tem me visto muito
"nas praças virtuais de costume". Achei bom: estou no caminho em que
quero estar.
Fui a um show no teatro "art déco" Paramount, na cidade de Oakland. Dois
fatos me chamaram a atenção. Plateia enorme, todos sentados, exceto
alguns que se levantaram para dançar sem sair do lugar. Ninguém gritou
"Senta!", como aconteceria no Brasil. Perguntei se isso era normal na
Califórnia e meu amigo respondeu que sim. Se alguém gritasse "Senta!",
seria fuzilado pelos olhares gerais. Dançar pode, gritar não. Fumar
maconha pode, cigarro não. Questão de hábito. Não estou criticando.
Outro fato que me chamou a atenção foi a luz dos celulares em uso,
cegando a visão de quem tentava ver o palco. Esse comportamento, do qual
estou tentando me livrar sem conseguir, está se alastrando. A tentação
de fazer e publicar uma foto do show é enorme. Por que fazemos isso?
Exibicionismo, só pode ser.
Na última semana, comecei a perceber que minha compulsão por fotografar
faz parte do meu quadro clínico. Mas percebi também algo mais
importante. Não sou a única viciada em tecnologia aqui em casa.
Entrei no quarto da minha filha de 13 anos outra noite e encontrei a
garota cheia de fios debaixo das cobertas. Ela assistia pelo Skype uma
amiga do Brasil deitada igualmente em sua cama. Elas estavam tão
cansadas que mal balbuciavam de vez em quando. Era madrugada. Elas não
queriam se desligar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário