quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Já previa punição, diz autor de jogo banido pela Apple

Soldados gritam com mineiros escravos no Congo, seguranças usam uma rede elástica para impedir suicídios de um prédio, e trabalhadores recolhem lixo eletrônico em condições deploráveis.
Esses são alguns estágios do jogo Phone Story, aplicativo polêmico que se propõe a mostrar o ciclo de vida de um smartphone.
Lançado na semana passada na loja virtual da Apple por US$ 0,99 (R$ 1,69), Phone Story foi banido quatro horas após ser anunciado e depois de ter sido baixado por cerca de mil usuários.
No dia seguinte, foi lançado em uma versão para Android, sistema operacional do Google para portáteis.

Criado pela desenvolvedora italiana MolleIndustria e idealizado pelo núcleo ativista Yes Lab, o jogo faz alusões à Apple e aos suicídios em 2010 na fábrica chinesa Foxconn, que produz componentes para Apple, HP e Dell.
Também traz referências às acusações de extração por escravos do minério coltan, usado em dispositivos eletrônicos devido à sua resistência a calor, na República Democrática do Congo. Michael Pineschi, do Yes Lab, falou à Folha sobre o desenvolvimento de Phone Story. "Lançamos o jogo como aplicativo para smartphones, porque isso cria uma interação direta: o telefone fala com você sobre o ciclo de vida dele", argumenta.
Sobre a menção à Apple no aplicativo, Pineschi diz que "todos os smartphones (e dispositivos eletrônicos) sofrem desses problemas, mas a Apple é o grande arquétipo".
O ativista admite que a retirada do jogo da Apple Store não foi surpresa. "Esperávamos que ele seria banido em algum momento".
Segundo o desenvolvedor Paolo Pedercini, da MolleIndustria, o jogo foi criado em pouco mais de dois meses, durante o "tempo livre", com auxílio financeiro do festival britânico de cultura digital AND (Abandon Normal Devices) e da bienal de design de Gwangju (Coreia do Sul).
"Mas tudo será doado, então o orçamento foi zero". O programador diz que as doações, que serão registradas no site da MolleIndustria, irão para a Sacom, ONG que defende direitos trabalhistas baseada em Hong Kong, assim que Apple e Google enviarem o dinheiro.
A versão para o Android está disponível no Android Mar-ket brasileiro por R$ 1,71. Segundo o programador, ela foi construída na madrugada seguinte ao banimento. Cerca de 3.000 pessoas baixaram essa versão do app.
A MolleIndustria é especializada em jogos com críticas ao capitalismo. Além de Phone Story, já fez Oilgarchy, sobre a indústria do petróleo, e McDonald's Videogame, sobre a rede de fast food.
VIOLAÇÃO
Para distribuir aplicativos na Apple Store, é preciso enviá-los para aprovação. O processo existe "para garantir que os aplicativos são confiáveis, funcionam como esperado, e estão livres de material ofensivo e explícito", segundo o site da empresa.
"Vamos rejeitar aplicativos que tenham qualquer conteúdo ou comportamento que vá além dos limites", disse a Apple, em diretrizes divulgadas para desenvolvedores, em 2010.
Segundo a MolleIndustria, o jogo Phone Story foi proibido 20 horas após sua aprovação por violar quatro termos de serviço da Apple Store, incluindo mostrar violência ou abuso de crianças e mostrar conteúdo excessivamente condenável ou grosseiro.
Também burlou a regra de que apps com função de receber doações devem ser gratuitos e a norma de que doação deve ser por navegador Safari ou SMS.
O desenvolvedor do game, Paolo Pedercini, disse que o app foi aceito pela Apple em "menos de uma semana, sem revisões".
Procurada pela Folha, a assessoria da Apple disse que a empresa não comentaria o caso.


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