quinta-feira, 28 de julho de 2011

Por que o grupo hacker LulzSec partiu para o ataque

Sua audácia era descarada e aparentemente sem temores. Entre as suas vítimas famosas estavam a Sony, a CIA, o FBI, o Senado norte-americano e até mesmo a agência do Reino Unido de combate ao crime organizado.
Expondo fragilidades em redes do governo e de corporações, o grupo vazou centenas de milhares de senhas hackeadas e, no processo, reuniu mais de 250 mil seguidores no Twitter. Mas, depois de apenas 50 dias, em 25 de junho, o LulzSec inesperadamente disse estar se separando.
Poucas horas antes desse anúncio, o "Guardian" publicou o vazamento de registros de bate-papo na internet revelando o funcionamento interno do grupo, que aparentava constituir-se de seis a oito membros. Os registros mostravam que as autoridades estavam, frequentemente, muito prestes a encontrá-los, e que, depois de um ataque a um site associado ao FBI, dois hackers haviam deixado o LulzSec por não estarem "dispostos a correr perigo".
Conforme a atenção da mídia aumentava, Ryan Cleary, 19, residente de Essex e suspeito de ser afiliado ao LulzSec, foi preso durante uma investigação envolvendo o Reino Unido e os EUA sobre crimes virtuais. Haveria a pressão se tornado tão alta a ponto de não ser mais possível controlá-la?
Ryan Cleary, adolescente britânico acusado de fazer parte do Lulz Security
A fim de investigar o caso, o "Guardian" localizou Topiary, um dos membros fundadores do LulzSec. Figura-chave no coeso grupo, ele foi identificado nos registros como sendo o responsável por gerenciar a conta do LulzSec no Twitter e por ter escrito os comunicados do grupo à imprensa. Depois de verificarmos a sua identidade, solicitando-lhe o envio de uma mensagem direta a partir de sua conta --"Este é o capitão do Barco Lulz", confirmou ele--, nós começamos uma longa conversa pelo Skype.
"Eu sei que as pessoas não acreditarão nisso. Nós [o LulzSec] realmente acabamos porque esse era o momento certo", disse ele. "Os vazamentos prometidos aconteceram. Completamos 50 dias e estamos próximos de alcançar 275 mil seguidores no Twitter. Nós estávamos no auge e decidimos redirecionar nossos fãs para o [coletivo hacker] Anonymous e para o [movimento hacker] AntiSec, concluindo nossas atividades habilmente. Uma nota alta, um final clássico, um 'big bang' e, então, um barco à vela no horizonte."
DIVERSÃO E POPULARIDADE
A imagem pública jovial do LulzSec, sem dúvida, ajudou-o a alcançar uma popularidade incomum dentro de um curto espaço de tempo. O seu objetivo declarado era oferecer "entretenimento de alta qualidade às suas custas", e a palavra "Lulz" é em si mesma uma gíria de internet para risos.
A popularidade do grupo subiu depois de ter plantado uma matéria falsa na agência de notícias norte-americana PBS (pbs.com) em protesto contra o que ele disse ser um documentário distorcido sobre o WikiLeaks feito pela emissora. A notícia falsamente relatava que o rapper Tupac Shakur, que foi morto em um tiroteio há 15 anos, havia sido encontrado vivo e saudável na Nova Zelândia.
"O que nós fizemos foi diferente de outros grupos hackers", disse Topiary. "Nós tínhamos um Twitter ativo (controlado por mim), gatos fofinhos em mensagens impactantes e, geralmente, uma aura brincalhona e caricatural em nossas operações. Nós sabíamos quando começar e quando parar. E, mais do que tudo, nós sabíamos como nos divertir."
Mas a missão do grupo, explica Topiary, não foi calculada. Quase tudo o que o LulzSec fez --de escolher o seu nome a definir um próximo alvo-- aconteceu espontaneamente. "Nós o criávamos conforme íamos caminhando. Originalmente, éramos o @LulzLeaks no Twitter, mas eu esqueci a senha. Então, nós nos tornamos o @LulzSec. Meu primeiro nome era The Lulz Train [trem Lulz], depois The Lulz Cannon [canhão Lulz] e, então, The Lulz Boat [barco Lulz]. Eu não tinha ideia do que era 'O Barco do Amor', foi um acidente total. Eu escrevi todas as notas à imprensa no Bloco de notas sem planejamento. Foi isso que nos tornou únicos. Nós viemos a público e criamos coisas do nada, publicando e tuitando o que parecia certo. Escrevíamos o que, para nós, precisava ser escrito. Não nos incomodávamos com planos ou reuniões de equipe, nós simplesmente agíamos."
Os registros de bate-papo vazados também revelaram que os hackers pareciam se deleitar com a atenção internacional recebida. No entanto, Topiary afirmou que não era o LulzSec que estava faminto pela mídia, mas a mídia que estava faminta pelo LulzSec.
"Nós não entramos em contato com um único meio de comunicação durante, pelo menos, os primeiros 40 dias. Eles simplesmente continuavam noticiando os nossos humildes tuítes", disse ele, embora admita que a atenção ofereceu-lhes "razões maiores para vazar ainda mais". "Claro, isso era emocionante e tinha um papel fundamental. Nós nos divertíamos, às vezes, confundindo e enganando os meios de comunicação com tuítes estranhos ou oferecendo exclusividade a certos jornalistas para irritar alguns outros. Esse foi um aspecto da situação que nos ajudou a alavancar o entretenimento."
Mesmo assim, embora muitos ataques do LulzSec tenham sido perpetrados "para o riso", o grupo foi acusado de atentado de extorsão por uma empresa de segurança norte-americana, a Unveillance --acusação que Topiary nega enfaticamente.
O grupo também foi criticado após ter invadido e despejado on-line milhares de nomes de usuários e senhas de clientes europeus da Sony Pictures, alguns dos quais foram, segundo notícias, usados posteriormente em golpes por fraudadores. Mas Topiary não se ressente disso.
"A culpa é da Sony por não defender --e criptografar-- as informações de seus clientes", diz ele. "Da mesma forma, em um mundo perfeito, nós teríamos despejado as informações citadas e nada teria acontecido. Esses golpes simplesmente provam que outras pessoas (nossos fãs/espectadores) são mais malvadas do que nós."
Ryan Cleary, acusado de fazer parte do LulzSec
WIKILEAKS, ANONYMOUS E REVOLUÇÃO
Rumo ao final do seu reinado, o LulzSec parecia gravitar em torno de causas mais claramente políticas. O grupo chegou a se comparar nos tuítes com o WikiLeaks, e o seu penúltimo vazamento foi um esforço conjunto com o Anonymous a fim de expor a polícia do Arizona como "racista e corrupta" e "sabotar seus esforços de aterrorizar comunidades que lutam uma injusta 'guerra contra as drogas'".
O Anonymous é bem conhecido por suas ações de "ativismo hacker" político. No dia 11 de julho, o grupo, segundo notícias, ameaçou atacar a Polícia Metropolitana por causa de grampos telefônicos feitos pela News International e da possível extradição para a Suécia de Julian Assange, fundador do WikiLeaks. No início deste ano, o grupo assumiu a responsabilidade por uma série de ataques de negação distribuída de serviço (DDoS, na sigla em inglês) a sites dos governos da Tunísia, do Irã, do Egito e do Bahrein. E, em 2008, o grupo atacou a Igreja da Cientologia depois que ela supostamente tentou impedir o vazamento de uma entrevista de vídeo com o ator e cientologista Tom Cruise. Topiary esteve fortemente envolvido com o Anonymous no passado, atuando algumas vezes como seu porta-voz em entrevistas televisionadas.
"O Anonymous tem sido uma ótima forma de atrair as gerações mais jovens por meio de métodos que eles entendem, como a internet", disse ele. "Meu objetivo principal com o Anonymous foi espalhar uma palavra revolucionária entre aqueles que possam estar buscando algo novo."
Como ele define uma revolução? "Revolução é chutar o governo tunisiano nos dentes, tornando os códigos maliciosos de seu JavaScript inertes e permitindo aos cidadãos da Tunísia navegarem no Facebook sem o medo de terem suas senhas descobertas. Revolução é uma horda de ativistas segurando máscaras do Anonymous, que nos agradece pela ajuda concedida no árduo trabalho de suprimir sites de finanças, ações e ministério do governo deles, substituindo-os por palavras inspiradoras. Revolução, para mim, é derrubar os grandes sem esquecer de defender os pequenos."
Embora Topiary não divulgue a sua idade, ele se descreve como um adolescente e "um habitante da internet com paixão por mudanças". Ele acredita fazer parte de uma renovação geracional no modo como a tecnologia --especificamente a internet-- está cada vez mais sendo usada como uma ferramenta capaz de influenciar o mundo. As ações do Anonymous, em particular, diz ele, atraíram atenção para a ideia de que atos executados on-line podem ter um impacto significativo na vida real --"ligando as duas realidades". Mas ele também reconhece que as ações do Anonymous, do LulzSec e de outros hackers afiliados podem ser usadas por governos como justificativa para um controle maior da internet. Sendo assim, como ele equilibra as suas ações com essa possibilidade?
"Isso só resultará em maior controle do governo se nós permanecermos apáticos e deixarmos isso acontecer", diz ele. "O objetivo do Anonymous é cortar brutalmente essa decisão ao meio e gritar 'NÃO' a leis com as quais não concordamos. As leis devem ser respeitadas quando são justas, não obedecidas sem questionamento."
FÉRIAS
No entanto, Topiary está agora tirando umas férias das infrações à lei. Ele afirma que vai continuar operando às margens do Anonymous, mas sem se engajar mais em ações hackers. Em vez disso, ele pretende criar arte, vídeos e gráficos para o grupo a fim de ajudar em um novo projeto de relações públicas, a ser intitulado Voice.
"Estou [trabalhando] nele sem parar há um bom tempo, é algo que toma bastante tempo", diz ele. "Algumas pessoas são capazes de lidar como isso durante anos, e eu respeito essas pessoas. Eu simplesmente precisava de um pouco de ar e de uma nova página na era Anonymous/LulzSec."
Após a prisão de Cleary no mês passado, hackers norte-americanos suspeitos de serem afiliados ao LulzSec tiveram suas casas invadidas pela polícia em Ohio e Iowa. No passado, hackers receberam imunidade em causas criminais se cooperassem com as autoridades. Mas, se fosse pego, Topiary afirma que "jamais denunciaria" outros hackers e que preferiria "muito mais" ir para a prisão do que trabalhar para o governo em qualquer função.
"Não tenho certeza de que eu teria um lugar na segurança do governo, a menos que eles gostem de tuítes bizarros", diz ele. "Mas, novamente, não, eu não aceitaria um trabalho no qual tivesse que lutar contra tudo aquilo pelo que lutei. Bem, no que se refere às autoridades, se elas estão com as garras afiadas, não há muito o que eu possa fazer. Mas só espero que eles não tenham localizado algum de nós, especialmente meus amigos do LulzSec."

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