Enquanto amamenta o bebê, Beatriz responde aos e-mails do trabalho.
O marido se aborrece: "Você é explorada". Ela dá de ombros. "Se o
trabalho é flexível, posso ficar mais tempo com as crianças." Fora do
escritório, a publicitária Beatriz Magalhães, 32, gerente de uma agência
em São Paulo, não fica nem meia hora sem acessar a internet no telefone
celular.
"Minha caixa de entrada parece um gremlin. Brota e-mail na tela. E é
tudo trabalho. Minha vida pessoal não é tão agitada", diverte-se.
Smartphone, iPad, computador portátil e intranets que permitem acessar
ambientes corporativos remotamente tornaram-se instrumentos fundamentais
para os que têm cargo de liderança, profissionais liberais ou para quem
está em ramos em que é preciso estar disponível e ser ágil.
Mas esses "gadgets" -palavra da moda para se referir a esses aparelhos- têm o efeito de prolongar a jornada dos trabalhadores.
Sociólogos e juristas a firmam que essa nova dimensão do trabalho ainda
não foi percebida com clareza nem pelas empresas nem pelos
profissionais.
"Esse trabalho não é reconhecido, não é remunerado e não há consciência
crítica sobre ele", diz Marcio Pochmann, presidente do Ipea (Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada) e especialista em políticas de trabalho.
Para Pochmann, o modo como se organiza a jornada de trabalho de
profissionais ligados ao conhecimento -que realizam o chamado "trabalho
imaterial"- coloca em xeque a legislação.
"Existem doenças que ainda não são percebidas como doenças do trabalho,
como a depressão, que são decorrentes desse ritmo frenético."
O economista José Márcio Camargo, professor da PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio de Janeiro, discorda.
Segundo ele, a possibilidade de completar uma parte da jornada fora do
escritório aumenta o bem-estar do trabalhador, embora de fato possa
elevar também o número de horas dedicadas ao emprego.
"Há efeitos positivos e negativos das novas tecnologias, mas não tenho dúvida de que os efeitos positivos são maiores", diz ele.
Para o pesquisador, seria um "desastre" se a legislação trabalhista
limitasse as possibilidades das novas tecnologias. "Nesse caso, o
trabalhador e a empresa perderiam toda a liberdade e a flexibilidade."
AÇÕES JUDICIAIS
O juiz do trabalho Wilson Pirotta, titular da 3ª Vara de Guarulhos (SP),
relata já ter julgado casos em que funcionários pedem pagamento de hora
extra pelo tempo trabalhado via internet. Segundo ele, a reclamação é
comum entre empregados de bancos. Pirotta diz que a legislação não faz
distinção sobre o lugar em que o trabalho é feito e que as leis atuais
podem ser interpretadas a favor dos trabalhadores nesses casos.
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