segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Autora de livro sobre MySpace explica queda do site; leia entrevista

Para Julia Angwin, editora de tecnologia no "Wall Street Journal", as redes sociais não são apenas a principal frente de um novo modelo econômico.
Os aplicativos que acompanham o Twitter e levam novos públicos aos jogos no Facebook, a integração de contas por meio de mecanismos como Google Buzz e Facebook Connect e o fato de as redes não serem suficientemente valorizadas por anunciantes são motivos de preocupação e devem moldar o futuro nos âmbitos cultural, social e legal.
Angwin tem acompanhado o tema desde 2007, quando começou a investigar a história do MySpace, site de relacionamento adotado por músicos de diversos estilos, por sua facilidade de divulgação, e comprado pela News Corporation, em 2005, por US$ 580 milhões.
Seu fracasso parece ter ocorrido por acaso. É a impressão deixada pelo título de seu livro, "Stealing MySpace - The Battle to Control the Most Popular Website in America" (Roubando o MySpace - A Batalha para Controlar o Site Mais Popular dos EUA, ed. Random House), cujo subtítulo só ficou atual por um mês.
Depois de lançá-lo em março do ano passado, a autora viu em abril o MySpace ser desbancado, em número de visitas, pelo Facebook.
Mas o livro contém informações que ajudam a explicar o declínio do site, que continua a perder posições na audiência da web: sua origem menos profissional do que a concorrência.
Em entrevista à Folha, Angwin lamenta que, junto com o MySpace, esteja caindo o estandarte do relacionamento virtual anônimo, que garante maior privacidade e liberdade de expressão.
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FOLHA - Por que o MySpace perdeu a liderança?
JULIA ANGWIN - Eles foram lentos para reagir tecnologicamente, se atualizar. Não perceberam a tempo que precisavam acrescentar novas atrações, que as outras redes eram ameaças.
Sofreram um pouco com a fadiga das pessoas, a tendência para migrar para as novidades, é verdade, mas não fizeram o bastante para mantê-las. Nessa área, se você não inova, fica para trás: as páginas demoram para carregar, o software é velho...
FOLHA - Como a sra. descreveria seus criadores, Chris DeWolfe e Tom Anderson?
ANGWIN - Criaturas típicas de Los Angeles. Diferentemente dos engenheiros do Google ou do Yahoo!, são pessoas "espertas", mais do que tecnologicamente interessadas, são gênios do marketing, mas de um nível um pouco baixo de marketing.
Fizeram um marketing sujo no início, para conseguir tocar as coisas. Distribuíram "spyware" [programas que roubam informações do computador do usuário], fizeram spam.
FOLHA - Ben Mezrich lançou "Os Bilionários Acidentais", sobre o Facebook. Não acha que o sucesso MySpace é mais apropriadamente "acidental"?
ANGWIN - Muito mais acidental. Os criadores do MySpace foram realmente heróis improváveis. Os criadores do Facebook eram estudantes de Harvard, gente bem preparada e interessada, que às vezes larga tudo para começar algo novo -a velha história de Bill Gates e Steve Jobs.
FOLHA - A sra. teve o azar de ter o subtítulo do livro desatualizado logo após o lançamento...
ANGWIN - Foi muito azar! Foi verdade por mais de um ano e, um mês depois de lançado, não era mais.
FOLHA - ...E agora, enquanto vê as redes sociais lutarem pelo público, consegue predizer quem tomará o lugar do Facebook?
ANGWIN - Não dá para adivinhar, mas, como os usuários estão mais amadurecidos com as redes sociais, suponho que se irritem com o fato de o Facebook fazer mudanças a toda hora.
Não há mais a euforia, as pessoas estão ficando mais cínicas quanto às redes, querem exigir responsabilidade dessas empresas.
Portanto o maior interesse pode ser em ter controle sobre seu perfil, sua privacidade, as possibilidades de montar sua interface.
Gosto do modelo do Ning. Você monta sua própria rede social com suas regras e sem ser encontrado se não quiser. Líderes iraquianos estão usando esse tipo de rede para compartilhar histórias e traumas, sem usar um espaço público.
A ideia de fazer isso em sites onde as pessoas já estão, como o Google faz no Gmail, é boa; mas não estou nada contente com o Google quanto à questão da privacidade.
FOLHA - As diferentes redes usam mecânicas diferentes. Acha que a tendência é uma homogeneização, quando surgir uma fórmula vitoriosa, mais ou menos como ocorreu com serviços de e-mail grátis?
ANGWIN - Parece que teremos as plataformas de massa, como Facebook, onde todos estão justamente porque todo mundo já está lá. Mas também haverá nichos para participar daquilo que você não quer compartilhar, para controlar melhor a conversa, ter uma relação mais íntima.
FOLHA - Mais usuários sempre quer dizer mais dinheiro?
ANGWIN - Esse é um ponto importante: há uma subvalorização desses sites. Eles ganham dinheiro, mas certamente não o que se espera de quem tem milhões de espectadores. Essas redes ganham menos do que poderiam com anúncios. Enquanto isso, os sites ficam um pouco dependentes de um mercado sujo para viver.
Por exemplo o Twitter ter de vender dados para o Google e o Bing. Os usuários do Facebook geralmente não têm conhecimento de quanto de seus dados são disponibilizados.
FOLHA - Esses sites são o centro do que parece ser um novo modelo de negócio, baseado em transações mais frequentes, de valores baixos, do mercado de aplicativos -especialmente jogos. O Facebook tomou a dianteira nisso também?
ANGWIN - Sim. É verdade que o Twitter também tem uma plataforma boa para aplicativos -mas não são jogos, e sim programas para a visualização de informações. Os jogos são os mais populares aplicativos desse novo mercado.
FOLHA - Mas isso não pode ser ruim para o Facebook? Pois jogos têm mais apelo entre jovens, o público-alvo do MySpace, enquanto as informações de joguinhos enchem a página do Facebook e atrapalham seu design, célebre pela "limpeza"...
ANGWIN - Pode ser irritante o fato de o Facebook mudar a toda hora o funcionamento de seus recursos, agora receber informações sobre os jogos de outras pessoas, mas ele deve corrigir isso. A questão principal é quais jogos são mais divertidos.
A novidade poderia favorecer o MySpace, porque tem o público mais adequado, mas os programadores bacanas não estão por lá: sua tecnologia é desatualizada e ocorre uma deserção maciça --perderam 1 milhão de usuários em um mês. Logo, as empresas não veem razão para investir nele.
FOLHA - No ano passado, a sra. aventou a possibilidade de o Twitter ser o novo "carrão" do pedaço. Ele é?
ANGWIN - O Twitter tem seus problemas, ele e o Facebook experimentam suas "dores de crescimento" e crise de identidade, uma falta de clareza sobre onde querem estar. Muito disso vem da falta de condições de fazer dinheiro. O Facebook prevê lucros neste ano, mas não tanto quanto se esperaria de alguém com mais de 300 milhões de usuários.
O interessante é que o "ecossistema do Twitter" ultrapassou o próprio Twitter em importância; posso usar o TwitterDeck e nunca mais entrar diretamente no endereço do Twitter; já o Facebook permanece como portal para os aplicativos que abriga. O futuro do Twitter fica em dúvida.
FOLHA - Hoje é comum cultivarmos uma persona em cada rede, múltiplos avatares. Com tentativas de integrar as redes sociais, como Facebook Connect e o Google Buzz, perderemos pluralidade?
ANGWIN - O Facebook tem convencido muitas pessoas de que é mais seguro mostrar seu nome verdadeiro hoje. Mas existe uma necessidade de anonimidade que é intrínseca à liberdade de expressão, à expressão política.
Vide o exemplo dos protestos no Irã. Precisamos poder ser anônimos. Infelizmente o maior fórum para a anonimidade é o MySpace, que falhou de tantas outras formas.
O Twitter é confuso em relação à anonimidade: pede isso de algumas celebridades, mas não do público em geral, permite imitadores que façam paródia, mas não "imitadores sérios", há um problema aí. A tentativa de integrar tudo numa só senha, concentrar todas as suas relações, preocupa.
FOLHA - Assim, devemos considerar um risco que empresas como o Google e as redes sociais colecionem tamanha base de dados pessoais? Acredita que possam em breve ser limitadas pela Justiça, assim como a Microsoft teve problemas nos anos 90 por monopolizar o mercado?
ANGWIN - É um risco. Vemos em casos como o dos hackers chineses que atacaram o Google: mesmo que estejam bem intencionados, aqueles que detêm as informações não podem garantir muita segurança. E as companhias nem sempre estão muito interessadas em nossa privacidade.
FOLHA - Como as pessoas vêm se acostumando a ser observadas, adicionadas e "retuitadas", caminha-se para um mundo sem privacidade?
ANGWIN - Preocupo-me muito com isso: a definição de privado tem ficado mais estreita, as leis precisam ser repensadas.
Hoje, um usuário pode ligar para o YouTube dizendo que uma canção de sua autoria está on-line sem sua autorização e eles irão removê-la; mas não há o direito de pedir para tirarem um vídeo de si mesmo dançando nu. Ficamos sem direito sobre nossa identidade, não é?
Não existe a mesma garantia legal dos direitos autorais. Muitos juristas têm refletido sobre isso.

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