Angry Birds, o aplicativo pago mais vendido para o iPhone nos Estados
Unidos e Europa, foi baixado mais de 1 bilhão de vezes por jogadores
entusiásticos de todo o mundo, que muitas vezes dedicam horas a
arremessar passarinhos ruidosos contra grupo de porcos ladrões de ovos.
Embora os jogadores comuns conheçam as qualidades destrutivas
específicas de alguns desses pássaros, muitos não estão cientes de uma
faceta: o jogo tem grande capacidade de recolher informações pessoais
sobre seus usuários.
Quando Jason Hong, professor associado do Instituto de Interação Ser
Humano-Computador, na Universidade Carnegie Mellon, entrevistou 40
usuários, apenas dois deles sabiam que o jogo armazenava dados sobre sua
localização, usados posteriormente para encaminhar a eles publicidade
dirigida.
"Quando faço palestras sobre isso, há pessoas que pegam os celulares e
apagam o jogo na hora", disse Hong, especialista em privacidade nos
aplicativos móveis, em entrevista. "Em termos gerais, a maioria das
pessoas desconhece o que está acontecendo".
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Quanto mais pessoas passam a usar apps, mais os marqueteiros buscam maneiras de monetizá-los |
E o que está acontecendo, de acordo com especialistas, é que aplicativos
como o Angry Birds e outros softwares que parecem ainda mais inócuos,
como aqueles que transformam o celular em lanterna, oferecem definições
de dicionário ou oferecem citações da Bíblia, em muitos casos também
estão recolhendo informações pessoais, em geral sobre a localização e
sexo do usuário, bem como o número de identificação do celular
inteligente. Mas em certos casos eles também coletam informações de
listas de contato e fotos das galerias de imagens.
Com a transição da internet para os aparelhos móveis, as questões de
privacidade dos apps para celulares ganharam destaque no debate sobe que
informações podem ser coletadas, quando e por quem. No ano que vem,
mais pessoas terão acesso à internet via smartphones e tablets do que
por meio de computadores pessoais, de acordo com o grupo de pesquisa
Gartner.
A mudança deixa os consumidores em uma área de indefinição jurídica, na
qual as proteções existentes à privacidade não acompanharam bem a
evolução da tecnologia.
O avanço da internet móvel deflagrou um debate entre os ativistas da
privacidade e as empresas on-line, que consideram que o acúmulo de
informações pessoais serve como espinha dorsal a uma internet na qual a
publicidade é a principal fonte de receita.
Nos Estados Unidos, as práticas de coletas de dados dos produtores de
apps são pouco regulamentadas, se é que o são; alguns deles nem mesmo
revelam que dados estão recolhendo, e para que fim.
POR MAIS TRANSPARÊNCIA
Em fevereiro deste ano, Kamala Harris, secretária da Justiça da
Califórnia, chegou a um acordo com seis grandes operadoras de
plataformas de aplicativos móveis para que estas vendam ou distribuam
apenas apps cujas normas de privacidade possam ser revisadas pelos
usuários antes do download.
Ao anunciar o acordo voluntário com a Amazon, Apple, Google,
Hewlett-Packard, Microsoft e Research in Motion, cujas plataformas de
distribuição respondem pela maior parte do mercado norte-americano de
aplicativos móveis, Harris ressaltou que a maioria dos aplicativos
móveis não divulgava normas de privacidade.
"O custo de usar um aplicativo móvel não deveria ser a perda de privacidade", ela declarou quando do acordo.
Mas a simples revelação de normas não basta, por si só.
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O Twitter (aplicativo na foto) mostra propagandas entre os textos enviados por usuários |
A Rovio Entertainment, da Finlândia, produtora do Angry Birds, revela
suas normas de coleta de dados em um texto de 3.358 palavras disponível
em seu site. Mas como no caso da maioria dos produtores de aplicativos
em todo o mundo, o aviso da Rovio serve mais para evitar
responsabilidade do que para informar positivamente.
A companhia aconselha os usuários que não desejem que seus dados sejam
recolhidos ou que publicidade personalizada seja dirigida a seus
aparelhos a visitar o site da Flurry, a companhia que analisa os dados
recolhidos por ela, e que registrem seus dados em dois sites setoriais
que compilam listas de usuários que não desejam que dados sobre eles
sejam recolhidos. Mas a empresa finlandesa aponta que nem todas as
companhias respeitam essas listas de restrição voluntária.
Como último recurso, a Rovio aconselha aqueles que desejam evitar coleta
de dados a não utilizar seu produto: "Se você quer ter certeza de que
publicidade relacionada a comportamento não lhe seja dirigida, por favor
não use ou acesse nossos serviços".
A despeito de múltiplos pedidos de entrevista, por telefone e pela
internet durante cinco dias, a Rovio não respondeu minhas perguntas.
'LI E CONCORDO'
Práticas de privacidade como as da Rovio pouco fazem por informar o
consumidor. A maioria das pessoas clica nas autorizações sem ler o
texto, diz Hong, da Carnegie Mellon. O instituto em que ele trabalha
está desenvolvendo uma ferramenta de software chamada App Scanner cujo
objetivo é ajudar os consumidores a identificar que tipo de informação
um aplicativo recolhe, e para que provável propósito.
As revisões propostas na regulamentação de proteção de dados da União
Europeia, agora em debate nos comitês de liberdades civis, justiça e
assuntos internos do Parlamento Europeu, requereriam que as empresas de
Web obtenham consentimento explícito dos usuários antes de recolher
dados. Uma proposta também daria aos consumidores a capacidade de
escolher que informação uma loja de aplicativos pode deter sobre eles,
sem restringir sua capacidade de usar o software que ela fornece.
Mas a redação dessas cláusulas revisadas, que só devem entrar em vigor
no final de 2013, ou ainda mais tarde, levou as empresas mundiais de
tecnologia, a maioria das quais sediadas nos Estados Unidos, a
empreender um esforço de lobby por normas menos rigorosas de
consentimento, para não prejudicar a os modelos de negócios sustentados
por publicidade que bancam muitos aplicativos gratuitos.